sábado, 25 de junho de 2011

chuva ...

' As coisas vulgares que há na vida
Não deixam saudades
Só as lembranças que doem
Ou fazem sorrir
Há gente que fica na história
da história da gente
e outras de quem nem o nome
lembramos ouvir
São emoções que dão vida
à saudade que trago
Aquelas que tive contigo
e acabei por perder
Há dias que marcam a alma
e a vida da gente
e aquele em que tu me deixaste
não posso esquecer
A chuva molhava-me o rosto
Gelado e cansado
As ruas que a cidade tinha
Já eu percorrera
Ai... meu choro de moça perdida
gritava à cidade
que o fogo do amor sob chuva
há instantes morrera
A chuva ouviu e calou
meu segredo à cidade
E eis que ela bate no vidro
Trazendo a saudade! '


quinta-feira, 23 de junho de 2011

alma ...



' Sou um evadido.
Logo que nasci
Fecharam-me em mim,
Ah, mas eu fugi.

Se a gente se cansa
Do mesmo lugar,
Do mesmo ser
Por que não se cansar?

Minha alma procura-me
Mas eu ando a monte,
Oxalá que ela
Nunca me encontre.

Ser um é cadeia,
Ser eu é não ser.
Viverei fugindo
Mas vivo a valer! '

Fernando Pessoa

quarta-feira, 22 de junho de 2011

mar salgado

' Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!

Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu! '

Fernando Pessoa

terça-feira, 21 de junho de 2011

medo ...



' Quem dorme à noite comigo
É meu segredo,
Mas se insistirem, lhes digo,
O medo mora comigo,
Mas só o medo, mas só o medo

E cedo porque me embala
Num vai-vem de solidão,
É com silêncio que fala,
Com voz de móvel que estala
E nos perturba a razão

Gritar: quem pode salvar-me
Do que está dentro de mim
Gostava até de matar-me,
Mas eu sei que ele há-de esperar-me
Ao pé da ponte do fim! '

segunda-feira, 20 de junho de 2011

como é que se esquece Alguém que se ama?

Como é que se esquece alguém que se ama? Como é que se esquece alguém que nos faz falta e que nos custa mais lembrar que viver? Quando alguém se vai embora de repente como é que se faz para ficar? Quando alguém morre, quando alguém se separa - como é que se faz quando a pessoa de quem se precisa já lá não está?
As pessoas têm de morrer; os amores de acabar. As pessoas têm de partir, os sítios têm de ficar longe uns dos outros, os tempos têm de mudar Sim, mas como se faz? Como se esquece? Devagar. É preciso esquecer devagar. Se uma pessoa tenta esquecer-se de repente, a outra pode ficar-lhe para sempre. Podem pôr-se processos e acções de despejo a quem se tem no coração, fazer os maiores escarcéus, entrar nas maiores peixeiradas, mas não se podem despejar de repente. Elas não saem de lá. Estúpidas! É preciso aguentar. Já ninguém está para isso, mas é preciso aguentar. A primeira parte de qualquer cura é aceitar-se que se está doente. É preciso paciência. O pior é que vivemos tempos imediatos em que já ninguém aguenta nada. Ninguém aguenta a dor. De cabeça ou do coração. Ninguém aguenta estar triste. Ninguém aguenta estar sozinho. Tomam-se conselhos e comprimidos. Procuram-se escapes e alternativas. Mas a tristeza só há-de passar entristecendo-se. Não se pode esquecer alguem antes de terminar de lembrá-lo. Quem procura evitar o luto, prolonga-o no tempo e desonra-o na alma. A saudade é uma dor que pode passar depois de devidamente doída, devidamente honrada. É uma dor que é preciso aceitar, primeiro, aceitar.
É preciso aceitar esta mágoa esta moinha, que nos despedaça o coração e que nos mói mesmo e que nos dá cabo do juízo. É preciso aceitar o amor e a morte, a separação e a tristeza, a falta de lógica, a falta de justiça, a falta de solução. Quantos problemas do mundo seriam menos pesados se tivessem apenas o peso que têm em si , isto é, se os livrássemos da carga que lhes damos, aceitando que não têm solução.
Não adianta fugir com o rabo à seringa. Muitas vezes nem há seringa. Nem injecção. Nem remédio. Nem conhecimento certo da doença de que se padece. Muitas vezes só existe a agulha.
Dizem-nos, para esquecer, para ocupar a cabeça, para trabalhar mais, para distrair a vista, para nos divertirmos mais, mas quanto mais conseguimos fugir, mais temos mais tarde de enfrentar. Fica tudo à nossa espera. Acumula-se-nos tudo na alma, fica tudo desarrumado.
O esquecimento não tem arte. Os momentos de esquecimento, conseguidos com grande custo, com comprimidos e amigos e livros e copos, pagam-se depois em condoídas lembranças a dobrar. Para esquecer é preciso deixar correr o coração, de lembrança em lembrança, na esperança de ele se cansar.

Miguel Esteves Cardoso, in 'Último Volume'

domingo, 19 de junho de 2011

eu não sei quem te perdeu ...

Quando veio,
Mostrou-me as mãos vazias,
As mãos como os meus dias,
Tão leves e banais.
E pediu-me
Que lhe levasse o medo,
Eu disse-lhe um segredo:
«Não partas nunca mais»

E dançou,
Rodou no chão molhado,
Num beijo apertado
De barco contra o cais.

E uma asa voa
A cada beijo teu,
Esta noite
Sou dono do céu,
E eu não sei quem te perdeu.

Abraçou-me
Como se abraça o tempo,
A vida num momento
Em gestos nunca iguais.
E parou,
Cantou contra o meu peito,
Num beijo imperfeito
Roubado nos umbrais.

E partiu,
Sem me dizer o nome,
Levando-me o perfume
De tantas noites mais.

E uma asa voa
A cada beijo teu,
Esta noite
Sou dono do céu,
E eu não sei quem te perdeu! '

Pedro Abrunhosa


sábado, 18 de junho de 2011

jamais desista!

" ... Jamais desista de si mesmo. Jamais desista das pessoas que você ama. Jamais desista de ser feliz, pois a vida é um espectáculo imperdível, ainda que se apresentem dezenas de factores a demonstrarem o contrário!"

Fernando Pessoa

quarta-feira, 15 de junho de 2011

querer ...



' Quer pouco, terás tudo.
Quer nada: serás livre.
O mesmo amor que tenham
Por nós, quer-nos, oprime-nos! '

Fernando Pessoa

terça-feira, 14 de junho de 2011

segunda-feira, 13 de junho de 2011

a máquina ...



Saber o que fazer,
Com isto a acontecer,
Num caso como o meu.
Ter o meu amor,
Para dar e pra vender,
Mas sei que vou ficar,
Por ter o que eu não tenho,
Eu sei que vou ficar.
É de pedir aos céus,
A mim, a ti e a Deus,
Que eu quero ser feliz,
É de pedir aos céus.
Porque este amor é meu,
E cedo, vou saber
Que triste é viver,
Que sina, ai, que amor,
Já nem vou mais chorar,
Gritar, ligar, voltar,
A máquina parou,
Deixou de tocar.
Sentir e não mentir,
Amar e querer ficar,
Que pena é ver-te assim,
Já sem saberes de ti.
Rasguei o teu perdão,
Quis ser o que já fui,
Eu não vou mais fugir,
A viagem começou,
Porque este amor é meu
E cedo vou saber,
Que triste é viver,
Que sina, ai, que amor.
Já nem vou mais chorar,
Gritar, ligar, voltar,
A máquina parou.
Deixou de tocar,
É de pedir aos céus,
A mim, a ti e a Deus,
Que eu quero é ser feliz,
É de pedir aos céus.
Porque este amor é teu,
E eu já só vou amar,
Que bom não acabou,
A máquina acordou!

sexta-feira, 10 de junho de 2011

quarta-feira, 8 de junho de 2011

você saberá que é amada ...

Você saberá que é amada
quando ele te olhar com mais carinho do que desejo
com mais ternura do que paixão

Você saberá que é amada
quando ele pedir mil desculpas por ter chegado atrasado
e você perceber nos olhos dele
que ele está com o coração na mão

Você saberá que é amada
quando ele não medir esforços para te ver
para te agradar
nem para demonstrar de todas as formas
o quanto ele te adora e te quer bem

Você saberá que é amada
quando mesmo que você sequer o esteja notando
ele não pare de te rodear
ansioso por te encher de mimos e carinhos

Você saberá que é amada, enfim,
quando ele ligar para você quando você menos esperar
nem que seja apenas para ouvir tua voz
e te desejar um lindo dia,
e continue sempre a cantar
e a declarar os sentimentos dele por você
mesmo que ele não ouça de você
uma única palavra,
e continue mostrando-se completamente apaixonado
mesmo que ele saiba
que qualquer coisa que ele faça
será totalmente em vão...

Augusto Branco