sábado, 12 de dezembro de 2009

o efeito boomerang

A VIDA ensina a desconfiar de dois tipos de homens: dos que falam muito e dos que estão sempre a querer agradar. Aprendi com os primeiros que quanto mais falam, menos devemos levar a sério o que dizem. Se prometem levar-nos a Veneza logo que a relação começa, o mais provável é a viagem nunca acontecer. Se falam prematuramente em casamento e se perdem a imaginar uma lista de nomes possíveis para possíveis descendentes, é certo que acabam por desistir das duas empreitadas. E se nos dizem amo-te 20 vezes por dia, o mais certo é que, ao primeiro desentendimento, encontrem outra a quem vão dizer o mesmo em menos de uma semana.

O GÉNERO disco riscado que se repete sem mostrar sinais de cansaço remete directamente para a categoria do ‘agradador’. O agradador está sempre bem disposto, dá-se bem com todas as pessoas da nossa família, é capaz de levar a sobrinhada ao cinema e a futura sogra à opera, mostrando-se disponível e prestável, incansável e, pensa ele, insubstituível. Nunca discute nem se zanga, preferindo uma solução de compromisso para todas as questões. Vive obcecado com a sua paixão, mulher de sonho, deusa perfeita que ele ama perdidamente, até ao dia em que rebenta de tanta magnanimidade e explode. E quando um agradador explode, leva tudo à frente. O efeito pode ser comparado ao do vulcão Krakatoa, num dia de forte actividade.

No fundo, o agradador é um inseguro que vive mergulhado no esforço de querer parecer sempre bestial. Ele gostava de ser perfeito aos olhos dos outros e está disposto a sacrificar gostos e vontades próprias para alcançar tal objectivo. Agrada para que gostem dele, elogia para que o elogiem, glorifica para ser glorificado. Para ele os sentimentos têm de ser recíprocos, assim como tudo o resto. Se um agradador tem pouco dinheiro, é capaz de convidar a mulher para um fim de semana romântico, mas deixa escapar quanto custou. Ou então pergunta-lhe várias vezes seguidas: «Gostaste, querida? Foi um presente». Ou seja, de uma forma ou de outra, e porque nunca age com naturalidade, acaba sempre por cobrar o que deu, pondo-se no papel da vítima quando é ele o carrasco. Não faz nada por acaso, por isso fica furioso e sente-se frustrado se as suas jogadas calculistas e deliberadas não o levam onde queria chegar.

O que trama o agradador é fingir ser uma pessoa que não é. Ninguém consegue fingir o tempo todo sem ficar exausto ou enlouquecido, ou as duas coisas. Como tudo nele é medido, está sempre a comparar o que fez pelo outro, o que fez pela relação, obcecado com o que o outro não fez por ele nem pela relação. O resultado de tanta contabilidade só pode ser desastroso.

MANDAM as regras do bom senso que o amor é para se dar com cuidado, mas sem cobranças. E quem dá a fazer contas ao que pode receber, acaba por sair de cena sem dignidade. Olhar para uma relação amorosa como um fundo de investimento pode levar a um poço sem fundo. É o efeito boomerang. Caso se encontre na iminência de ser atingindo/a por um, baixe-se e respire fundo. Os actos ficam com quem os pratica, é o próprio que acabará por ter de engolir o que fez!

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